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02 de Abril de 2019

Nota pública da Sociedade Brasileira de Ensino de Química sobre a comemoração do 31/03


Escrito por: Agências


Agências

A Divisão de Ensino da Sociedade Brasileira de Química vem a público repudiar veementemente qualquer tipo de comemoração que remeta à ditatura militar instalada no País no período de 1964 a 1985.

A ditadura militar brasileira, a partir de uma série de Atos Institucionais, impôs decisões que tinham o objetivo de garantir a permanência dos militares no poder. Houve cassações de mandatos parlamentares e suspensão de direitos políticos de muitos cidadãos. Também foram instituídas eleições indiretas nos estados da União, dificultando sobremaneira a ação da oposição ao regime em todas as regiões brasileiras. Dentre os 17 atos institucionais, o pior deles foi sem dúvida o AI5.

O AI 5, decretado em 1968, foi o responsável pela perda de direitos políticos, dando prerrogativa ao governo federal de decretar recesso do congresso, cessando também foros privilegiados, suspendendo a garantia de habeas corpus em casos de supostos crimes políticos contra o regime. O governo ditatorial passou a vigiar e interceder em publicações de jornais e revistas que de alguma forma se contrapusessem às suas orientações. A censura aos meios de comunicação, às artes e outros meios de expressão perdurou até o final da ditadura. Milhares de cidadãos foram presos por supostas ameaças à segurança nacional.

Em relação às universidades, citamos o decreto 477/69 que foi publicado com o fim exclusivo de perseguir professores e estudantes por qualquer ato considerado contrário ao regime e para impedirem qualquer atividade considerada subversiva. Em universidades brasileiras é possível ainda encontrar portas de salas de aula, ou de salas de professores, com pequenas janelas, pelas quais docentes eram vigiados em suas ações no ambiente de trabalho por órgãos como o DOI-CODI. Além disso, havia a verificação de antecedentes políticos dos professores por elementos vinculados aos órgãos de repressão antes que seus contratos fossem efetivados, inclusive e infelizmente com denúncias de outros colegas (vide Livro Negro da USP, disponível on line).

Tais atos, obviamente, geraram resistência. A ditatura militar brasileira assassinou “oficialmente” 434 pessoas (Relatório da Comissão da Verdade 2014/2015). No entanto, ao consideramos outras formas de “sumiço” de pessoas durante o período, que vão desde internações forçadas em hospitais psiquiátricos até outras mortes tidas como acidentes, suicídios, entre outras, podemos chegar a mais de 1000 mortos. Em relação à ditadura chilena em que se estima cerca de 40 mil mortos, e à ditadura argentina, com estimativa de 30 mil mortos/desaparecidos, há divulgação, por alguns meios de comunicação, de que a ditadura brasileira foi branda. Porém, o fato do número de mortes no Brasil ser menor não minimiza os horrores praticados pelo estado em termos de vidas ceifadas por não estarem de acordo com ideias e direcionamentos governamentais.

Além das mortes, a ditadura militar brasileira torturou das maneiras mais abjetas possíveis mais de 2000 pessoas, entre homens, mulheres e crianças. No entanto, pela falta de processos ou inquéritos investigativos sobre os agentes de tortura que serviram à ditadura brasileira, o número de mortos e torturados pode ser bem maior que o divulgado.

Finalmente, não é possível, portanto, comemorar o início da ditadura no Brasil, muito menos querer rever a história a partir de falácias, mentiras e desconhecimento. Nós somos antes de tudo educadores e é nossa função lembrar nossos alunos e os demais cidadãos do Brasil que este foi um período que macula a história brasileira, que deve ser lembrado, para não ser repetido.

Dia 31 de Março não é dia de comemorar. Pelo contrário. É dia de homenagear os que tombaram. É dia de lembrar que tivemos um passado ditatorial, para que possamos resguardar nosso futuro de situações semelhantes e mostrar aos mais jovens, que nunca viveram cerceados de sua liberdade de pensar e agir, que não podemos ter orgulho desse passado recente, pois esta não se configura como uma história a ser comemorada, mas sim como um período tenebroso que não pode nunca mais se repetir.

 

Prof. Dr. Márlon Herbert Flora Barbosa Soares – IQ – UFG

Profa. Dra. Nyuara Araújo da Silva Mesquita – IQ – UFG

Profa. Dra. Daisy Brito Rezende – IQ – USP

DIRETORIA DA DIVISÃO DE ENSINO DE QUÍMICA DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE QUÍMICA