A busca constante pelo aumento da produtividade, a pressão e o assédio exercido pelas chefias, as extensas jornadas e a falta de condições adequadas de trabalho são alguns dos fatores que contribuem para que o trabalhador desenvolva uma doença profissional.
Infelizmente, as doenças ocupacionais são uma triste e dura realidade nas empresas brasileiras, e estão muito perto da vida dos trabalhadores.
No início de agosto, a Natura, uma das maiores fábricas da categoria química, foi condenada em primeira instância pela Vara do Trabalho de Cajamar a pagar indenizações para dez trabalhadoras e a reintegrar outras duas.
Essas trabalhadoras foram demitidas pela Natura no final de 2010, e já apresentam doenças ocupacionais, como lesões por esforços repetitivos/Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (LER/DORT), adquiridas nas linhas de produção da empresa.
Nos anos 70, quando a saúde do trabalhador passou a ser levada mais a sério, as enfermidades eram geralmente relacionadas a agentes físicos, como ruídos, radiações e poeiras, ou decorrentes de agentes químicos, como solventes e benzeno.
Para falar desse assunto, o Jornal do Unificados entrevistou o médico sanitarista e do trabalho, doutor Roberto Carlos Ruiz (foto acima), consultor em saúde do trabalhador do Sindicato Químicos Unificados.
ENTREVISTA
Jornal do Unificados: Quais são as principais doenças ocupacionais que atingem os trabalhadores brasileiros?
Dr. Ruiz: Atualmente, nós temos dois grandes grupos de doenças: os transtornos músculos-esqueléticos (LER/DORT) e os transtornos psíquicos. Com relação às LER/DORT elas podem se apresentar de várias maneiras, como tendinites, tenossinovites, bursite, epicondilite, síndrome do túnel do carpo, lombalgia ou cervicalgia, entre outras. Já os transtornos psíquicos em geral se manifestam através de depressão, ansiedade, síndrome do pânico.
Jornal do Unificados: Como a pressão por produção e as jornadas extensas contribuem para que os trabalhadores desenvolvam doenças ocupacionais?
Dr. Ruiz: Sem dúvidas, um dos maiores riscos presentes hoje no trabalho é a pressão por produzir cada vez mais em um tempo menor. A gente olha os ambientes de trabalho bonitos, limpos e organizados e pergunta, mas como alguém fica doente aqui?
Pois são justamente os riscos invisíveis, aqueles que não se medem com aparelhos, que estão ocasionando doenças e acidentes de trabalho.
Tecnicamente, chamamos estes riscos de ergonômicos, ligados em geral à questão do modo como o trabalho é organizado. Assim, o que temos visto na prática são metas sobre-humanas, ou seja, que dificilmente um ser humano normal vai conseguir cumprir sem ficar lesionado.
Os casos de doenças do trabalho que eu tenho atendimento nos últimos 20 anos, como regra, são ocasionados a partir da exposição a este tipo de risco, que podem ocasionar tanto doenças osteomusculares como transtornos psíquicos.
Jornal do Unificados: Como o assédio moral, infelizmente muito comum na maioria das empresas do país, pode contribuir para que o trabalhador desenvolva alguma doença do trabalho?
Dr. Ruiz: O assédio moral não é uma doença do trabalhador, mas, sim, uma doença do ambiente de trabalho. Existem empresas que têm um comportamento permissivo, ou seja, que permitem que um chefe, encarregado ou líder de setor façam assédio moral junto aos trabalhadores.
Desta forma, sob a pressão de um assediador, o trabalhador em geral vai adoecer depois de um período. Os trabalhadores têm que saber que devem se defender frente a casos de assédio moral. E uma atitude muito importante é procurar seu sindicato ou dirigente sindical para lhe dar apoio nestes casos.
Jornal do Unificados: O estresse é hoje um dos problemas que mais atingem os trabalhadores. Como um ambiente de trabalho ruim pode contribuir para um maior número de casos de estresse?
Dr. Ruiz: Como disse anteriormente, os fatores ergonômicos ligados à organização do trabalho podem adoecer. Colocar metas impossíveis, exigir mais do que um trabalhador pode oferecer, trabalhar sempre com prazos curtos e equipes pequenas para dar respostas rápidas se constitui em um importante fator de estresse.
Assim, os trabalhadores têm que discutir no seu local de trabalho se a carga não está muito elevada. E procurar discutir com a chefia sobre estes fatores. Se tiverem problemas, podem procurar o sindicato, que tem a obrigação de apoiar os trabalhadores.
Eu sei que o Sindicato Químicos Unificados (Campinas, Osasco e Vinhedo) conta com diretores sindicais que constantemente estão circulando nas fábricas, e eles devem ser procurados nos casos de dúvidas pelos trabalhadores.
Jornal do Unificados: Existem formas para os trabalhadores de prevenirem de doenças ocupacionais?
Dr. Ruiz: Sim. Normalmente, as empresas centram a discussão de prevenção exclusivamente no uso de EPI (Equipamento de Proteção Individual). Isto é uma prática muito atrasada, pois a indicação de EPI só deve ser feita quando ainda não se tem uma solução definitiva para os riscos ambientais, e de maneira temporária.
O que vemos é que muitas empresas indicam o EPI de maneira eterna (protetor auricular para ouvidos, por exemplo). Assim, a melhor forma de proteção são os EPCs (Equipamentos de Proteção Coletiva), o que constitui em várias soluções de engenharia para mudar os ambientes de trabalho, eliminando ou minimizando os riscos ali existentes.
Jornal do Unificados: Qual é a responsabilidade das empresas no adoecimento dos trabalhadores?
Dr. Ruiz: Em minha opinião, é a empresa que detém o controle de eliminar ou não os riscos existentes no trabalho, fazendo a opção por melhorar o ambiente e não colocar seus trabalhadores em risco.
Felizmente, foi superado no Brasil um conceito arcaico, o chamado ato inseguro, onde se dizia que a maior parte dos acidentes de trabalho ocorre por culpa do trabalhador.
Era muito comum a culpa ser do morto nos acidentes fatais. O quadro tem melhorado bastante nesta área, mas há uma certeza: Os trabalhadores precisam se unir e se organizar através de entidades sindicais combativas. Nada vai melhorar de graça. Não existe avanço sem lutas.