O número de assassinatos de indígenas no Brasil cresceu de 110 para 135 (22,7%) entre 2017 e 2018. Do total de homicídios registrados no ano passado, 62 foram em Roraima e 38 no Mato Grosso do Sul, de acordo com levantamento feito pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), ligado à Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
O Cimi listou ainda 22 tentativas de assassinato, 18 homicídios culposos, 15 episódios de violência sexual, 17 casos de racismo e discriminação étnico-racial, 14 ameaças diversas, 11 situações de abuso de poder e oito ameaças de morte.
Efeito Bolsonaro
As invasões de terras indígenas, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio dessas populações, que subiram de 96 para 111 entre 2017 e 2018, aumentaram ainda mais nos primeiro nove meses do governo Jair Bolsonaro (PSL).
Segundo dados preliminares divulgados esta semana na sede da CNBB, em Brasília, entre janeiro a setembro foram registradas 160 “invasões possessórias, exploração ilegal de recursos naturais e danos diversos ao patrimônio” a 153 terras indígenas em 19 estados brasileiros. Os 111 casos registrados no ano passado atingiram 76 terras indígenas de 13 estados da federação.
Bolsonaro, não custa lembrar, já fez vários comentários, tanto antes quanto depois de ser eleito presidente, que podem estimular a violência contra os povos indígenas do Brasil e colocar em dúvida o direito deles a terra. Em 12 de abril de 1998, segundo o Correio Braziliense, disse: “Pena que a cavalaria brasileira não tenha sido tão eficiente quanto a americana, que exterminou os índios”. Em agosto deste ano, segundo o UOL, disse: “Se eu fosse rei de Roraima, com tecnologia, em 20 anos teria uma economia próxima do Japão. Lá tem tudo. Mas 60% está inviabilizado por reservas indígenas e outras questões ambientais”.
Os responsáveis pelo estudo, que estão no relatório Violência contra os Povos Indígenas do Brasil – Dados 2018 -, dizem que essas formas de violação contra os territórios ocorrem há décadas, mas recentemente muitos invasores deixaram de somente explorar ilegalmente os recursos, como se limitar a retirada de madeira, e passaram a se apropriar das áreas, por meio de práticas de grilagem e loteamento de parte dos territórios.
O documento cita as terras indígenas Arariboia, no Maranhão, e Karipuna e Uru Eu Wau Wau, em Rondônia.
Outro problema, afirmam, é a implantação de garimpos ilegais. De acordo com o Cimi, um exemplo é a terra indígena Munduruku, no Pará.
“O madeireiro entra, limpa a terra, tira a madeira e a área passa a ser destinada à especulação imobiliária. É a prática do fato consumado. Retira da terra o que ela tem para oferecer e repassa para o grileiro, que vai lutar para que esta área seja legalizada. E o Estado desestrutura os órgãos que deveriam coibir as invasões de terra”, pontuou Roberto Liebgott, um dos autores da pesquisa.
Demarcação
O relatório lista 821 casos de “omissão e morosidade na regularização das terras” e 11 conflitos envolvendo direitos territoriais. De acordo com o Cimi, de 1.290 terras indígenas no Brasil, 821 (63%) teriam o que a organização chama de “alguma pendência do Estado para a finalização do processo demarcatório".
O cacique Suruí, do povo Pataxó e aldeia Barra Velha, em Porto Seguro (BA), afirmou o caráter originário dos povos e pediu a demarcação de terras indígenas. “Estamos no Brasil desde muito antes de Cabral. Nós somos os primeiros brasileiros, não somos os últimos. Estamos lutando por demarcação.”
Os representantes do conselho criticaram a afirmação feita por Bolsonaro durante discurso na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), de que não pretende demarcar novos territórios. Para eles, esse tipo de fala estimula a violência contra os povos indígenas.
"Os povos indígenas, ao reivindicarem a demarcação de seus territórios, tornam-se alvos a serem combatidos. Que as chagas da violência não sejam patrocinadas por aqueles que devem combatê-las. Que o Estado se coloque ao lado dos direitos humanos e da natureza", diz o presidente do Cimi, dom Roque Paloschi.