Em tempos de golpe e estado de exceção no Brasil, quem mais sofre com ataques aos direitos é a mulher, principalmente as mais pobres. O governo ilegítimo e golpista de Michel Temer (MDB-SP), com sua política neoliberal, não se importa com direitos da classe trabalhadora, menos ainda com questões fundamentais que garantem equidade entre os gêneros.
A filósofa Marcia Tiburi, em entrevista para o Portal CUT, analisa as conquistas da luta feminista desde o direito de trabalhar fora e até andar de biquíni sem ser molestada; o machismo e o papel que a sociedade impõe as mulheres - de donas de casa perfeitas e também trabalhadoras – e o golpe de Estado que colocou homens, brancos e velhos no poder.
Marcia enxerga no golpe que tirou do poder a presidenta eleita legitimamente, Dilma Rousseff “uma manobra para reestabelecer o poder do homem branco, proprietário, heterossexual, dono do poder. Foi um golpe executado por racistas, misóginos e neoliberais”.
Segundo ela, os governos Lula e Dilma sempre se contrapuseram a esse modelo conservador e, Dilma, por ser mulher, foi o alvo o principal dos golpistas.
Mexeu com uma, mexeu com todas
“Essa pessoa [Dilma] sofreu na sua pele e no lugar [cargo de presidente da República] que lhe era assegurado por direito. Houve discurso de ódio contra ela, por ser mulher. Não dá para desconsiderar o caráter de preconceito de gênero do golpe”, afirma Márcia Tiburi, que complementa ressaltando o machismo dos meios de comunicação brasileiros: o ataque da mídia contra Dilma é algo feito constantemente contra todas as mulheres trabalhadoras.
Marcia Tiburi reafirma os avanços sociais dos governos Lula e Dilma, fala sobre a defesa da democracia e do direito de Lula ser candidato nas eleições deste ano, ressaltando como essas lutas são fundamentais para as mulheres, cujas conquistas estão sendo atacadas quase que diariamente pelo golpista Temer.
Trabalho em dobro
Para a filósofa a mulher é a maior vítima dos ataques aos direitos sociais e trabalhistas que Temer vem impondo ao país desde 2016, “porque trabalham em dobro e numa sociedade neoliberal, na qual o machismo está enraizado, obrigando a mulher a ter dupla, até tripla jornada, e sem remuneração adicional”. Elas trabalham em casa para suas famílias, “para seus homens”, em caráter de “obrigação”.
Por isso, a filósofa acredita que direitos específicos para as mulheres não são privilégios e sim justiça social. Um dos exemplos que ela deu é a idade mínima para a aposentadoria que hoje é de 60 anos para as mulheres e 65 anos para os homens. Essa diferença de idade, para Márcia, compensa o desequilíbrio social entre homens e mulheres.
O governo, em mais uma tentativa de ataque aos direitos das mulheres tentou aprovar uma reforma da Previdência, cuja votação foi suspensa graças à pressão do movimento sindical, que aumentava a idade mínima de aposentadoria das mulheres, a principio para 65 anos, depois baixou para 62, ainda acima da idade atual.
O papel da mulher
Para a filósofa, toda mulher é trabalhadora por natureza porque nasce com uma carga simbólica que carregará por sua vida. É como se a sociedade tivesse inventado a mulher para usá-la como reprodutora, para trabalhar em casa e para fora, enquanto os homens ficam em uma condição mais confortável.
“Muitas mulheres não se dão conta de que são vítimas dessa ‘naturalização’ do trabalho, que nada mais é que uma estratégia perversa do patriarcado. A sociedade acostuma a mulher a acreditar que é obrigação dela exercer todas essas tarefas. Isso é uma violência. Quase um trabalho escravo, moralmente aceito pela sociedade conservadora”, diz Marcia se referindo às duplas, até triplas jornadas das mulheres.
É a ‘violência simbólica’ que vem acompanhada da violência física e a violência sexual. “E todas são desenvolvidas juntas. Homens vivem em um sistema de privilégios enquanto as mulheres em condição de violência”, conclui a filósofa.
É necessário rever a construção cultural da sociedade, diz Marcia Tiburi, falando sobre o machismo que domina as relações no mundo inteiro e que no Brasil é mais pesado. “É uma forma de autoritarismo, de marcação sobre o outro indivíduo”, diz se referindo à maneira como a sociedade classifica e discrimina as mulheres.
“As piadinhas, os discursos misóginos e de ódio contra as mulheres e a desqualificação da mulher têm de ser combatidos”.
Para a filósofa, a construção de uma nova cultura tem como ponto de partida a educação e o modo como a sociedade forma as pessoas. Para ela, instituições como a escola têm responsabilidade nesse processo, o que não acontece no país.
“No Brasil, o projeto de educação vem lá dos moldes dos anos 1960: uma educação para ricos, outra para pobres e as duas formas são machistas”, ela explica.