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16 de Outubro de 2017

 “O debate da estrutura sindical precisa ser retomado”, alerta o historiador Rossano Sczip


Escrito por: Intersindical Central da Classe Trabalhadora


Intersindical Central da Classe Trabalhadora
Legenda: Rossano Sczip , historiador
Crédito: Nelson Egídio

O historiador Rossano Sczip abriu o Seminário "Reforma Trabalhista: Resistência e Impactos sobre a Organização da Classe Trabalhadora", promovido pela Intersindical na última sexta-feira (13), com uma aula sobre a construção da organização dos trabalhadores e do sindicalismo no Brasil.

Passam de 15 mil os sindicatos no Brasil. Hoje somente 20% dos trabalhadores são filiados. “Esse debate da estrutura sindical precisa ser retomado. Hoje quem mais debate a estrutura sindical é a direita e o movimento sindical parou de pautar essa questão”, alerta Sczip. Essa baixa adesão, segundo o historiador, é porque o sindicato não precisa dos trabalhadores para existir e isso precisa mudar.

A Consolidação Geral das Leis do Trabalho (CLT) é fruto da luta da classe trabalhadora. Só que a legislação sindical envolve desde Getúlio Vargas um tripé que comprime a luta da classe trabalhadora: o reconhecimento oficial pelo Ministério do Trabalho, o monopólio da representação (unicidade sindical) e as contribuições obrigatórias por lei, ou seja, o imposto.

“Isso significa que o sindicato é uma concessão do Estado e não fruto da organização da classe trabalhadora”, explica Sczip. “O Estado dizer que o sindicato pode existir é a argamassa do controle sindical. O Estado concede o poder de negociação. Até a década de 30 era o poder de luta dos trabalhadores e a contribuição financeira também vinha deles”.

A unicidade, ou garantia de representação, é mais uma forma de controle estatal sobre a representação sindical. “O Estado dá a autorização de representação e entrega a base de apoio ao garantir a unicidade. É o monopólio da representação, o que é incompatível com a autonomia, com a plena liberdade de constituir sindicatos”, explica.

Até 1930 o movimento sindical era livre, autônomo, independente ,combativo e pautou o governo sobre toda a década de 30. Daí vem a criação da Consolidação Geral das Leis do Trabalho (CLT), que agora está sendo desmontada.

Para entender o contexto do movimento sindical hoje e a resistência de muitos trabalhadores contra o movimento vale conhecer um pouco da história da estratégia construída pelo Estado brasileiro para controlar a classe trabalhadora.

Breve pincelada sobre a história do sindicalismo

Sczip explica que a historiografia brasileira convencionou o início da luta e da organização da classe trabalhadora na primeira República, mas que já existia a organização de trabalhadores livres e escravizados desde a segunda metade do século 19.

“Há registros de greves desde a segunda metade do século 19 destacando-se a  greve dos tipógrafos em 1858, a partir de 1880 elas se generalizam e as greves se tornam o principal instrumentos de luta da causa operária. Entre 1900 e 1909 foram 109 greves no Rio de Janeiro. Foi quando o movimento operário passou a sintetizar suas reivindicações.

 “Falar em sindicato é mais em 1910, 1920, antes havia organizações com pluralidade de expressões e uma constelação de correntes ideológicas”, explica o historiador.

Sob a liderança dos anarquistas houve a greve geral de 1917 (que começa no Cotonifício Crespi, a partir de uma reivindicação das mulheres e depois se espalha por outros, por solidariedade) e a greve geral de 1919.

Além dos anarquistas, atuavam socialistas reformistas, chamados de amarelos, católicos, sindicalismo de ação direita ou revolucionário (inspirado na experiência francesa apesar de se assemelhar ao anarquismo), a partir de 1922 chegam os comunistas.

Até então o movimento sindical era livre, autônomo, independente ,combativo e pautou o governo sobre toda a década de 30. Quando Getúlio Vargas  entra no ministério do Trabalho e assume o Governo já havia um movimento construído pela classe trabalhadora que culminou com a criação da Consolidação Geral das Leis do Trabalho (CLT).” Getúlio sintetiza e responde aos trabalhadores”, afirma o historiador.

Os anarquistas perdem a hegemonia, pois há repressão dura, perseguição, exílio e extradição de vários militantes. Cada corrente apresentava uma concepção de sindicato. Com exceção da esquerda que defendia concepções mais radicais, os demais defendiam entendimento entre patrões e empregados sem a ocorrência de greves. “ Isso é importante para a gente ver a resposta estratégica que o Estado pós 1930 vai usar”, ressalta Sczip.

Entre 1930 e 1934 ocorreram várias greves e poucos sindicatos recorreram à oficialização imposta pela Era Vargas. “Então o governo espertamente vincula a concessão dos direitos trabalhistas a estar filiado a um sindicato oficial do Estado. Depois dá uma segunda tacada exigindo a garantia da representação classista via sindicato na Assembleia Constituinte de 1934. “Portanto, o Estado amarra e a partir dali não há como ficar fora da estrutura sindical oficial”, explica Sczip.

Outra tacada do governo foi a repressão, a partir de 1935, com a perseguição aos sindicatos não oficiais e a colocação de interventores nas direções mais combativas.

“O Estado articula ação controladora do Ministério com ação repressiva da polícia política. Concilia intervenção e controle com repressão e eliminação física das lideranças políticas”, explica.

As próximas fases, de 1945 a 1964, oscilam entre liberalização e repressão. E de 1964 até os dias de hoje a ditadura e os governos de conciliação usam a mesma legislação, intervenção e  tática para conter a articulação autônoma da classe trabalhadora.

“Foi difícil para a classe trabalhadora pautar o Estado para conseguir patamares civilizatórios das organizações de trabalho”, lembra Rossano Sczip. "A luta e a resistência têm que continuar".